O antebraço esta caído sobre o braço do sofá empunhando fumaça e brasa. Coloca fogo no ar que respira para prestar atenção no que tenta esquecer: não parece nada fácil encontrar uma nova pessoa no espelho.
A água morna escorre delicadamente sobre seu corpo afogando-lhe o rosto num mergulho vertical ascendente. Mesmo o filete de água fria que jorra do defeito do chuveiro lhe agrada. Prazer. Esta é a primeira e única palavra que lhe define o momento e que paira sobre seu pensamento. Amanda precisava daquele instante. Como é que se conhece, de fato, alguém?A mão escorre o corpo tocando delicadamente cada centímetro de carne, perpassando os dedos no breve instante de pele nua que há entre um pelo e outro. Os olhos fechados criam mundos coloridos e ardentes: nuvens dispersas num céu azul, grama verde, poesia, a umidade do orvalho escorrendo entre as folhas, entre os galhos, entre a coxas entreabertas de Amanda. O ar umedecido pelas partículas de saliva expiradas entre suspiros, entre gemidos, entre reclames ardentes de Amanda. Aquele cheiro amadeirado, aquele cheiro de suor, aquele cheiro de orgasmo. Aquela pele estranha, roçando, coçando, irritando, esfolando. Aquela sensação de leveza, aquele gemido seco, aquele apertar das unhas na pele alheia, aquele realizar-se, aquele enfraquecer de pernas e braços deixando-se atirar relaxado.
O sol esquentando a manhã. O calor vaporizando o asfalto do outro lado do parque, nas paredes dos prédios, nos tetos metálicos dos carros estacionados, no suor das pessoas que passam apressadas, sempre apressadas, correndo atrás de sua pressa, cegas, mudas, surdas. Pessoas que não se conhecem, que se olham, mas não se conhecem, que se cruzam, mas não se conhecem, que se tropeçam, mas não se conhecem. Mas se estão todos os dias. Se amontoam todos os dias em trens, ônibus, calçadas, elevadores. Juntamente distantes. Amanda não entende bem aquilo tudo. Quem entende?
Dá-lhe o último beijo, de bom dia e de adeus, recolhe as garrafas de espumante, ajeita o cabelo, suspira lentamente e se põe a caminhar em direção ao seu carro, vaporizando sob o sol três quadras além daquela praça, daquela arvore, daquela grama, daquele ser que conhecera na noite anterior num esbarrão e que entregou seu sexo, seus desejos e agora dá adeus, sem nem olhar pra trás, sem nem lhe perguntar o nome, sem nem lhe incluir na sua vida, quanto mais, numa lembrança. Assim como fazem todos todos os dias, pelas calçadas, pelos ônibus, pelos trens, pelos elevadores.
Afinal, como é que se conhece, de fato, alguém?
A fumaça branca está dissipada pela sala. Seus olhos mal se mantêm abertos. Já basta. Ponto final.
quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário